Há alguns dias, num debate de idéias com um amigo, descobrimos que temos algumas ideologias em comum. Entre elas, a Teologia da Libertação. Fato que me deixou feliz, talvez um pouco surpreso. Tendo em vista que esse amigo é declaradamente ateu.
O fato é que esse evento me levou a refletir sobre meus ideais, sobre o que já vivi e como vivo atualmente. É interessante observar que com o passar dos anos, vamos perdendo aquele ímpeto da juventude, aquela vontade de transformar o mundo o mais rápido possível.
Lembro-me bem que meus ideais de esquerda foram moldados durante o extinto segundo grau, período em que foi despertado em mim a paixão pela Ciência História. Minha professora de História era uma idealista e suas aulas eram sempre carregadas de questionamentos sobre as origens e os motivos de determinadas injustiças sociais.
Naquela época eu já participava dos movimentos da juventude na Igreja Católica, mas ainda de forma bem discreta. Até que em 1991 entrei para um grupo de jovens denominado JUC – Juventude Unida com Cristo. Esse evento foi um marco na minha vida cristã. Na JUC vivíamos com intensidade as idéias de libertação, igualdade social, atuação política, etc.
Estávamos vivendo a plenitude das CEB’S – Comunidades Eclesiais de Base, em nosso bairro. A comunidade era participativa, espelhada nas primeiras comunidades cristãs, relatadas nos Atos dos Apóstolos. A JUC era um dos grupos de jovens mais atuantes de Goiânia, alguns de nossos membros eram inclusive das coordenações a nível de Arquidiocese e Regional Centro-Oeste.
O Arcebispo era Dom Antonio, que conduzia sabiamente a Arquidiocese de Goiânia. Aqui no Conjunto Vera Cruz tivemos a ajuda de sacerdotes inesquecíveis como Frei José Fernandes, Padre Sebastião, Padre Antonio (baiano) e Padre Edivar. Também não posso deixar de lembrar da irmã Maria Luiza, missionária francesa que era exemplo de dedicação e fé.
A caminhada na Igreja nos levou ao engajamento político. Vários jovens filiaram-se em um partido político, que era exemplo de ética e renovação. Naquela época, nossa maior motivação era a vontade de mudar o mundo, tendo Jesus Cristo como exemplo. Fomos para a luta com a garra peculiar da juventude.
Trabalhamos em várias campanhas com tanta garra que os “cabos eleitorais pagos” eram superados nas abordagens e por vezes éramos até ameaçados de agressão.Tínhamos um diferencial, a ideologia, a esperança de uma sociedade mais justa e mais fraterna e principalmente, a fé no projeto de Jesus Cristo para o mundo, na sua mensagem evangelizadora e libertadora. Ganhamos nossa primeira eleição municipal na raça. O outro candidato, que era da situação, tinha do seu lado a máquina municipal e o poder econômico.
Infelizmente as mudanças não acontecem assim tão facilmente. A administração do novo prefeito não foi das melhores, apesar de ter uma cara nova, mais participativa. Porém, certas atitudes e posturas do novo prefeito não foram bem digeridas por aquela militância apaixonada. Foi a primeira dolorosa perda da inocência.
Ainda assim, continuamos trabalhando, continuamos com a esperança. As eleições gerais de 2001 e a vitória do Lula foram marcos em nossa caminhada. Foi a realização do sonho de toda uma geração. A “esperança venceu o medo”.
Os fatos que vieram a seguir foram determinantes para minha mudança de postura. Confesso que fiquei muito decepcionado com tudo o que aconteceu. Pessoas que eram exemplo de luta, de repente estavam envolvidas em escândalos. O Lula estava preparado para o poder, mas o seu partido não. O PT tem hoje a mesma postura de partidos antes abominados.
Com o tempo, a minha geração foi se tornando adulta e se dispersando. Cada passou a cuidar de sua própria vida, casamento, filhos, trabalho, etc. Talvez tudo o que aconteceu tenha sido motivador ou desmotivador, dependendo do ponto de vista. Mas considero que tudo seja fruto da evolução natural. Precisamos deixar que as novas gerações assumissem a luta, coisa que acho muito improvável, dado o índice de alienação dos jovens de hoje.
Até hoje nos encontramos e mesmo não tendo o ímpeto de outrora e raramente tocar no assunto, sinto que ainda temos os mesmos ideais. De certa forma teimamos em acreditar que não deu certo, que não conseguimos mudar o mundo.
Enfim, minha estória foi muito influenciada pela Teologia da Libertação, que me levou ao engajamento nas causas sociais. Confesso que me sinto decepcionado com muitas coisas que aconteceram. Na Igreja e nos governos do PT.
Hoje a Teologia da Libertação é só uma lembrança, foi um grito de libertação que infelizmente se calou. A Igreja deu um passo para trás. Ainda atuo na Pastoral da Catequese, mas sou o único daquela geração de abnegados que ainda insiste.